08/05/2010

OS MISERÁVEIS

O meu amigo João Teixeira, mais uma vez, manda-me uma crónica especialmente oportuna, tendo em atenção a situação difícil em que os mesmos que de há 34 anos para cá nos (des)governam colocaram o nosso país. Com o seu costumado sentido de humor, aqui a deixo para que a leiam e apreciem:


Devo confessar que me causa uma certa repulsa quando oiço pronunciar os erres muito além do arranhar próprio da consoante, sem contudo aproveitar uma letra, realmente original, do seu conteúdo. Também o salivar dos belfos, os perdigotos dos mal-educados, e até as buchas dos que não sabem como dizer e as frases corporativas ou técnicas dos que não sabem, de facto, falar. Mais me incomodam aqueles que já tudo viram e, sobre tudo (dizem) já se pronunciaram, deixando para os demais o papel de estultos plagiadores, invejosos das suas sentenças superiores, providenciais e exclusivas.


Pior ainda que tudo isto, tendo a não acreditar nunca em gente tal. E quanto maior o empenho dos protagonistas, maior se torna o filtro que utilizo para não lhes dar ouvidos.

Mas que raio de arenga havia de arranjar para falar das minhas reservas sobre quem coloca o país atrás do sol-posto e quem o vê saltitando alegremente, de nenúfar em nenúfar...

Há quatro ou cinco décadas, dizia-se que atrás de nós só a Grécia; hoje, passado todo este tempo, dizem que estamos à frente da Grécia: afinal em que é que ficamos? Mudou o quê neste país? Ou a arte da tão apregoada solução social democrata e liberal (leia-se PS, PSD e CDS, sem qualquer cronologia em especial) é, para além da gestão capitalista, uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma?


A mentira torna-nos surdos ou farta-nos de ouvir; a meia-verdade é uma urna com votos de que se alimentam os príncipes da democracia burguesa.

Na hora de arrepiar caminho aos putativos oásis de percurso, os visados são sempre os mesmos: os trabalhadores e os que menos têm. Pelo contrário, se algo é beliscado aos abastados, logo se acrescenta que é provisório, não vá a besta acordar no coração desses grados patriotas. À parte, delapida-se o património do Estado, privatiza-se, vende-se e mais do mesmo.


Como Fausto, o pacto será cumprido, nem que seja à custa da própria alma. Depois, venham cá dizer outra vez, daqui por trinta ou quarenta anos, que nem estamos à frente da Grécia, nem esta está atrás de nós. A realidade é que a Grécia, a pedido dos portugueses, terá deixado de existir e, por via disso, será dado por findo o pesadelo de décadas de perseguição, com comparações que só nos arreliaram e nos fizeram falar daquela maneira estúpida de cuspir, babar, carregar nos erres e tartamudear e por isso nos vimos gregos para chegar finalmente à cauda da europa.

Se o euro se converter em pó, como nós, com quem iremos à praça: com os que nada dizem ou com os que tudo sabem?

João de Sousa Teixeira
teijoao@gmail.com

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