18/10/2008

A Crise da Crise

O texto que se segue é de um grande amigo que, a meu pedido, enviou a deliciosa crónica sobre a crise do capitalismo. Apreciem-na e façam os vossos comentários.

A CRISE DA CRISE

Não sei ao que ache mais graça: se aos pps com chocarrices a propósito da anunciada ruptura financeira do capitalismo internacional, se à descoberta súbita por parte dos media, de crânios da história universal e da economia política e de outras eminências pardas, relativamente ao pensamento de Karl Marx e do materialismo histórico. O velhinho e até agora proscrito Capital corre assim o risco de se tornar o best seller do século XXI, cento e sessenta anos depois da sua primeira edição.
Em Setembro último, em entrevista dada à revista “Sin Permiso”, um tal Eric Hobsbawm, apresentado como “um dos maiores historiadores vivos”, foi confrontado com uma afirmação sua, segundo a qual, “ são os capitalistas, mais que outros, que estão descobrindo Marx”. Ou seja, parece que os estou a ver folheando os volumes da principal obra do filósofo alemão, qual livro de Pantagruel, tentando a fórmula das omeletas sem ovos ou, de salazar em punho, rapando a forma do bolo de notas, digo de natas. Mais dizia o historiador que “… (a) crença em que o capitalismo deve ser sucedido por uma outra forma de sociedade está baseada, não na esperança ou na vontade, mas sim em uma análise séria do desenvolvimento histórico, particularmente da era capitalista”. Ora aí estão as conclusões a que um homem chega após ter passado a vida inteira a queimar as pestanas, um punhado de neurónios e, agora, provavelmente os livros e papéis por onde estudou, e o obrigaram a fazer este papel… Podiam ao menos ter-lhe ligado mais cedo… Não deixam por isso, de ser perfeita estultícia, as notícias que dão conta do “suspiro de alívio” para a humanidade quando a propalada injecção de 700 mil milhões de dólares no mercado financeiro americano foi proposta, prevendo “a compra de acções podres pelos valores que elas tinham antes da crise, o que representa o dobro do que essas acções valem hoje, para garantir a solvência do mercado, ou seja, os lucros dos banqueiros e investidores.” (net) Não deixa de ser puro exercício de retórica burguesa, para não chamar cinismo, o anúncio da erradicação da crise ao nível da Europa comunitária, em resultado das conclusões dos recentes conversações de Paris, ou dos 20 mil milhões de Teixeira dos Santos. No entanto, garantem, tudo farão para salvar da ruína e da falência… o capital financeiro, que tanto tem sofrido e tão mal tem ficado na fotografia. Afinal, que seria de nós se não houvesse banca e bolsa e todo o lixo que produzem e vendem ao preço do ouro?
Mas esta crise não é o fim anunciado do capitalismo. Não, o capitalismo não cai como as folhas caducas no Outono. Porém demonstra, ao contrário do que dizem os propagandistas da falência do socialismo, que o capitalismo não é o futuro da humanidade, pintado ou não com as cores do neo-liberalismo. Julgo mesmo que o debate ideológico favorece os que defendem a luta dos trabalhadores pela construção duma sociedade sem exploradores nem explorados.


João de Sousa Teixeira
teijoao@gmail.com

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